Wednesday, December 29, 2004

Miguel Torga em 1946...

“Cada época é definida pelo que apresenta de novo, de especificamente seu. Pode não ser um alto pensamento filosófico, uma grande reforma moral, uma arte requintada, uma ciência generosa. Mas há-de ser a dádiva de qualquer uma dessas manifestações humanas, ou todas, numa concepção inteiramente inédita, original, inconcebível noutro tempo da história. Ora, quem olhar de boa-fé, sem cataratas e com o passado na memória, é obrigado a reconhecer que, se a nossa era tem um cunho, uma personalidade, uma cara própria, tal dom foi-lhe dado pelos Estados Unidos. Boa ou má, a arquitectura actual é americana. Americana pela concepção, e americana pela realização. Embora seja doloroso confessá-lo, a verdade é esta: quando mais tarde, os nossos tetranetos falarem de estilos, religiosos ou profanos, hão-de exprimir-se assim: depois da Grécia e de Roma, a humanidade teve o românico, o gótico e o barroco e … os arranha-céus. O seu a seu dono. Na actualidade, tudo quanto se constrói fora da asa prática do cimento e do aço, como carácter, é uma babugem do já feito e refeito. Vivo, singular, próprio – as casas de incontáveis andares de Manhattan. Mas se passarmos da arquitectura para o cinema, a grande expressão artística do presente, quem é que se atreve a negar que essa expressão é tipicamente americana? Cinema russo, cinema alemão, cinema francês…e acaba-se sempre em Hollywood. Arte alicerçada na técnica, onde poderia ser a sua pátria natural senão no país que a levou ao esplendor conhecido? É certo que a maioria dos sábios, dos artistas, dos filósofos e de todos os que são de verdade os obreiros daquela grande nação, nasceram aqui, na Europa. Tal circunstância, porém, não muda a face das coisas. O facto de só nos Estados Unidos, e apenas lá, terem dado a medida do seu génio, integra-os na expressão colectiva americana. Que importa que Charlie Chaplin seja inglês com quantos glóbulos tem? A humanidade há-de entendê-lo sempre ligado às rodas e às ruas de Nova York…”

E termina o diálogo com uma magnífica metáfora:

“Provado que Deus fez as abóboras e as melancias, provado está que fez também os melões. Agora o que podemos é não gostar das abóboras, das melancias e dos melões que crescem nas hortas doutros continentes…”

Saturday, December 25, 2004

DESPORTISTA DO ANO

Lance Armstrong

O único adversário que ele teve à sua altura, teve de derrotar com firmeza e persistência, foi o cancro. Após esse sofrimento, apareceu melhor do que nunca. Regenerou-se e de homem tornou-se num super-homem do ciclismo. Sim, porque ver a subir as montanhas dos Pirinéus e dos Alpes da forma como ele o faz, com a cadência e regularidade registada nos últimos 6 anos, não é para todos. Este ano consolidou a sua marca histórica no «Tour de France» e bateu o recorde dos vencedores, tornando-se no único ciclista a conseguir 6 Tour's.

Memorável o registo deste ano. A forma como ele ganhou 6 etapas no Tour, quem viu nunca esquecerá. Aquela juventude remanescente, aquela cadência de pedalada, aquela tipica entrega de vitórias aos adversários, aquela garra de quem vence pela primeira vez... para sempre!

Força Lance!

PERSONALIDADE DO ANO

José Manuel Durão Barroso

O homem que, um dia, disse que sabia que ia ser primeiro-ministro, só não sabia quando, nunca imaginou que um dia viria a ser Presidente da Comissão Europeia. A nível Europeu, que é a escala onde me insiro, acho que a sua nomeação é um orgulho para todos os portugueses, tal como ele o disse no parlamento europeu após a sua confirmação «Sei que a maioria dos portugueses estão hoje muito orgulhosos por ter um português presidente da Comissão Europeia.». Hoje, a Comissão tem um peso politico que não o tinha à uns anos atrás. Hoje, numa Europa a 25, é o elemento indispensável na ligação dos países pequenos e grandes da União. Portugal, como pais pequeno que o é, apesar da sua imparcialidade inerente ao cargo, ganha maior visibilidade na União com esta nomeação. Com esta decisão acho que a União ganhou um rosto, uma figura, que pode servir de ligação entre os EUA e a União.

Apesar de nesta distinção só ser analisado o lado bom da questão, claro que não nos podemos esquecer do vazio que ficou no governo da nossa Nação. Mas, não é todos os dias que temos o privilégio de ter um Português à frente dos interessas da União. E Durão nunca podia deixar de aceitar a nomeação, pois apesar de terceira escolha que o foi, é com muita honra vê-lo representar os interesses da União.

Boa sorte Durão!

Friday, December 24, 2004

Person of the year 2004? Talvez…



Não foi com surpresa que vi George W. Bush ser nomeado personalidade do ano pela revista «Time». Quando li na página oficial da Internet, comecei logo a pensar na motivação para tal nomeação.

E fiz aquilo que as pessoas devem fazer antes de tomar qualquer opinião: ler, ouvir, pensar e falar. Acho que este quarteto é fundamental para uma opinião fundada e bem estruturada. Todos temos direito à nossa opinião, mas também temos o dever de saber respeitar as opiniões contrárias, por muito que muitas vezes não concordemos. E para não alimentar a nossa ignorância, devemos antes de nos deixar levar pela argumentação fácil e dogmática, reflectir e ponderar.

Assim, e nesta minha maneira de proceder, foi o que fiz quando vi a nomeação pela primeira vez. Na nomeação feita e na argumentação escrita pelo seu director James Kelly, vi razões para a nomeação. Eu consegui perceber a argumentação dele porque não coloquei barreiras ao meu pensamento e colocar-me no ponto de vista do director.

Primeiro que tudo, temos de pensar na nomeação como o fim de um protagonismo levado a cabo pelo presidente norte-americano neste ano que finda. Em segundo, ver todo o trajecto politico que o perseguiu. E se pensarmos que perante uma sociedade norte-americana polarizada, com personalidades e media muito activos na campanha eleitoral, perante uma sociedade mundial unilateral na tendência de voto contra, depois de descer nas percentagens de popularidade de 90 para cerca de 46%. Se depois destes acontecimentos, ele ainda conseguiu sair vencedor das eleições americanas, com o maior número de votos de sempre, e ser reeleito para um segundo mandato, tem sem dúvida razões para que seja uma dadas pesonalidades do ano.

Perante estes argumentos eu concordo plenamente que seja a personalidade do ano. Concordar com a nomeação em particular não significa estar de acordo com as suas politicas em geral. Agora pergunto, não haverá alguém que mereça também esta distinção? É tudo uma questão de argumentação.

Transcrevo a argumentação do director da revista «Time»: «... he´s had his highs and lows, with aproval ratings at one point hitting 90% and then sinking to 46% as the war in Iraq kept claiming American lives. Even some of this strongest supporters never considered him the odds-on favorite to win a second term. But in the end, George W. Bush prevailed. For sticking to his guns (literally and figuratively), for reshaping the rules of politics to fit his 10-gallons-hat leadership style and for persuading a majority of voters this time around that he deserved to be in the White House for another four years, we name George W. Bush as Time's Person of the Year for 2004.».

Sunday, December 19, 2004

Le viaduc de Millau



O viaduto mais alto do mundo, localizado no Sul de França, foi inaugurada na Terça-Feira, dia 15 de Dezembro, pelo Presidente francês Jacques Chirac. O viaduto foi construído em tempo recorde, cerca de três anos e sem acidentes graves, tem um comprimento no sentido longitudinal e transversal de 2500 e 30 metros respectivamente. A altura média do tabuleiro ao solo é de cerca de 270 metros e o pilar mais alto atinge uma altura de 342 metros, mais alto do que a Torre Eiffel, em Paris.

Concebida pelo arquitecto britânico Norman Foster, o viaduto faz a ligação em auto-estrada entre o maciço central francês e a fronteira espanhola.

A obra é considerada por Foster "uma escultura na paisagem", ou como disse o presidente francês na cerimónia de inauguração, uma "maravilha da arte e da arquitectura". A ligação elevada, permite aos utentes desfrutar da paisagem rural e de vilas medievais, como a de Millau.

Por fim, o facto de a obra ter custado cerca de 394 milhões de euros, foi totalmente financiada pelo grupo de construção Eiffage, que detêm a concessão durante 75 anos. Uma originalidade reside na obrigatoriedade de a empresa restituir o viaduto ao Estado, daqui a 120 anos, na mesma situação em que se encontra na entrada em funcionamento. Um exemplo de investimento privado em função do bem público.

Monday, December 13, 2004

Estará a Arte Tradicional em crise?

Jeremy Deller tornou-se no mais recente vencedor do Turner Prize – o mais famoso prémio artístico do mundo atribuído pela Tate Britain em Londres, com a obra “Memory Bucket”. Surpreendente é o facto de a obra não ser uma pintura nem uma escultura, mas sim um vídeo. O filme reproduz marcos simbólicos de Crawford, terra natal, do presidente norte-americano George W. Bush, e tenta enquadrar o seu enredo na personalidade de Bush. O autor justifica desta forma a sua obra “eu não quis fazer uma crítica a Bush, mas também não sou fã dele. O meu interesse por ele é apenas na sua personalidade”.

Esta escolha foi surpreendente e inesperada para os mais famosos críticos de arte, que depositavam as suas escolhas outros nomes como o duo Bem Langlands-Nikki Bell, com uma recriação interactiva da casa em que Bin Laden viveu no Afeganistão; Yinka Shonibare, que apresentou uma série de instalações feitas com tecidos africanos; e por fim, Kutgul Ataman, que entrevistou um série de homens e mulheres que acreditam terem reencarnado.

Surpreendente também é o facto de nas escolhas dos candidatos nos últimos anos não figuram personalidades das artes tradicionais – pintura e escultura. Será que estão em crise os “Picassos” contemporâneos? Ou estamos perante novas formas de arte? Um facto deste panorama é o resultado de um inquérito efectuado recentemente sobre as peças de arte mais importantes dos últimos tempos. O mais votado foi para a «fonte» de Duchamp seguido de «Les Demoiselles d’Avignon» de Picasso. As escolhas variam, o curioso é que nas cinco primeiras posições eram ocupadas pelas ditas artes tradicionais.

Na minha a opinião a arte mudou. Tal como os livros estão cada vez mais a ser símbolo de relíquia, a arte está a desfigurar-se e a ser seduzida pelas potencialidades da informática. A imaginação tradicional está a dar lugar à imagem digital. Consequência dos tempos. Temos que redesenhar a nossa imaginação, e não deixar cair o verdadeiro trazer da arte tradicional. Nenhum computador substitui a sensação de estar num Metropolitan Museum of Art, num MoMA ou num Gugganheim. Apesar de ser um adepto da informática, tal como tantos outros, não prescindo da arte tradicional mesmo sabendo que arte é tudo aquilo que é fruto da nossa imaginação. Apenas uma opinião.